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SURF É MUITO YOGA

Julia Vaz. São Paulo, junho 2024.

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Eu surfando, pelo Osmar Rezende

Em maio, participei de um intensivo em um retiro com um professor que veio da Índia, um estudante muito querido e devotado do Sr. Iyengar e sua família. Como é um evento especial receber um professor do Instituto aqui no Brasil, tive a oportunidade de encontrar muitos amigos e amigas que vejo pouco, professores e professoras, colegas de jornada do Iyengar Yoga. Uma dessas pessoas era a Luciana de Lucca, com quem eu falei com mais calma no dia da nossa partida de volta para casa.

 

Eu já sabia que a Lu estava surfando, ficava admirando as fotos que ela postava no instagram, imaginando se eu também seria capaz de fazer isso.

 

Eu sempre quis surfar, desde pequena. Morava em lugar de praia, onde todo mundo pegava onda, até meus 13 anos, quando nos mudamos para uma região mais cosmopolita do Rio. Como eu amava a praia da Barra de Guaratiba, que os moradores roots chamam de "Guaratibali" – familiar, quase paradisíaca –, foi difícil me adaptar às praias lotadas da Zona Sul. E eu ainda não conhecia ninguém que gostasse de surf, então a capa do meu fichário, que era uma colagem de imagens de ondas e pranchas, acabou sendo trocada por outra mais cool, com nomes de bandas de rock, e o sonho de pegar onda foi se esconder em alguma gavetinha do meu coração. Até esse momento, na janela do quarto da pousada, conversando com a Lu.

 

– Eu vi que você tá surfando! Menina, eu sempre quis surfar.

– Vamos, Ju! Eu te levo. Você vai amar! É muito yoga.

 

Umas semanas depois, ela me mandou uma mensagem avisando que ia para a Riviera com uma amiga, e quando eu percebi, estava numa road trip sensacional com essas duas maravilhosas, Lu e Juliana. A Ju também é praticante e professora de yoga, e nós três logo nos vimos muito à vontade, conversando sobre tudo o que se pode imaginar.

 

Eu e a Lu fomos até o stand da escolinha e começamos nossa aula. O professor muito querido (Miojo) nos explicou algumas regrinhas básicas, nos fez algumas perguntas e então disse: "Você pega essa prancha e você pega aquela outra" e lá fomos pro mar.

 

Na areia, ele nos ensinou como se sobe, e eu não conseguia não lembrar de chaturanga dandasana, urdhva mukha svanasana, virabhadrasana 2… Mas, assim como yoga não é só asana, o surf também não é só subir na prancha.

 

De repente, o Miojo falava: "prepara pra subir!", empurrava a prancha, "vai!"

Quando eu vi, estava de pé, deslizando sobre o mar. As primeiras palavras que ecoavam eram: "o pé de trás primeiro", "olha pra frente", "gira o tronco e os quadris pra frente".

Depois, passaram para "sente a onda", "olha para a onda".

 

No final de semana seguinte, estávamos novamente as três indo para um aulão ministrado pela Tati da Mata e pela Aline Alegro (Sicrupt e SURFuncional), só para mulheres. Minas de todas as idades trocando histórias, experiências e contando como o surf mudou suas vidas.

 

O mar não estava colaborando, parecia uma piscina. "Tem dias que você vai entrar com medo, dias que vai dar trabalho, dias que você vai pegar muitas ondas, dias em que não vai conseguir pegar nada. E tem dias que você não vai nem entrar", dizia a Ju. Mas lá fomos juntas entrando no mar e as marolinhas nos surpreenderam. Onda após onda, os sorrisos imensos.

 

O mar ensina a impermanência. A não tentar controlar o que não se pode controlar. Ensina a aceitar que é a natureza quem manda.

 

Entrar, remar, esperar, remar, subir, deslizar, cair. Entrar, remar, esperar, remar, subir, deslizar, cair. Entrar, remar, esperar, remar, subir, deslizar, cair. Entrar, remar, esperar, remar, subir, deslizar, cair. E nunca uma repetição é igual à outra. O mar ensina o que o yoga ensina. Não existe um dia igual ao outro. Não existe um asana igual ao outro. Não existe uma onda igual à outra, nem um corpo igual ao outro. O surf é muito yoga.

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